sábado, 22 de fevereiro de 2014

GESTÃO DE EDUCAÇÃO INFANTIL

1. Este curso como os demais apresentados neste portal são Cursos Livres e você terá acesso gratuito ao seu conteúdo e avaliação, o certificado de conclusão de curso é facultativo. 

2. O certificado de conclusão deste Curso Livre é válido em todo o Brasil com amparo legal no Decreto Presidencial n° 5.154, de 23 de julho de 2004, Art 1° e 3°. E na lei nº 9.394, que estabelece as Diretrizes e Bases da Educação Nacional que mostra que os Cursos Livres passaram a integrar a Educação Profissional.

3. Você poderá utilizar o Certificado de Conclusão de Curso para completar horas em atividades extra-curriculares exigidas em faculdades, contar como atividades em concursos públicos ou simplesmente constar em seu currículo.

4. Se você já tem conhecimento sobre um assunto e precisa de um certificado para comprová-lo, basta clicar em Solicitar a Prova. (Não há necessidade de fazer a leitura do curso para prestar a prova de suficiência.

5. Após concluir um curso e tirar o certificado do mesmo, seus dados ficam salvos em nossa base de dados, diariamente diversas empresas entram em contato conosco, solicitando indicações, sendo assim, estudando conosco você poderá aumentar suas chances de conquistar um bom emprego

1a. Lição: Introdução

Este curso pretende mostrar alguns princípios teóricos para o entendimento de crianças de 0-6 anos na instituição de Educação Infantil(1), acerca de uma educação de qualidade, realmente preocupada com a formação integral da criança enquanto protagonista dos processos de ensino e aprendizagem. Sob esta perspectiva, focalizamos uma proposta que sugere o não artificialismo educativo ou uma mera transmissão de atividades sem contextualização pedagógica. Para que isto ocorra faz-se necessário buscar uma aprendizagem mais significativa e que supere este artificialismo educativo no trabalho com crianças visando apenas a assistência aos cuidados e deixando o educar para responsabilidade do ensino fundamental; acreditando que a criança precisa ter maturidade para começar aprender.
Este curso é destinado a educadores que acreditam que a criança é um ser social e que aprende com o meio através da ludicidade os conceitos das coisas que a rodeia, e que almejam mudanças imediatas no contexto mais amplo do sistema educacional brasileiro referente ao atendimento infantil.
Para isso, partimos da análise dos referenciais teóricos encontrados(2) sobre o assunto identificando alguns eixos importantes para nossa reflexão sobre a gestão da educação infantil no atendimento da criança de 0-5 anos.
Os estudos teóricos que fizemos permitem refletir sobre os conceitos que estão sendo discutidos no meio acadêmico recentemente, ajudando-nos a avançar na direção dos objetivos propostos neste curso.
Acreditamos que a superação da dicotomia entre educar e cuidar só é possível se acompanhado de uma conscientização política educacional por parte do educador em relação a sua formação continuada: ser um profissional(3) reflexivo e aberto a aprender a aprender no sentido de buscar novas alternativas possíveis na melhoria da qualidade de ensino.
Fundamentamos este trabalho principalmente nas idéias e no universo de princípios político-pedagógicos desenvolvidos por educadores atuais, como podemos constatar na referência bibliográfica encontrada na última lição.
Pelo próprio caráter deste curso, que visa mostrar a importância da gestão pedagógica na educação infantil e que considera a criança um ser em processo constante de aprendizagem e que nos remetemos a autores que propõem alternativas possíveis a mudança de postura profissional em um processo de revisão de conceitos já arraigados pelo próprio histórico da educação infantil no Brasil e conseqüentemente as teorias e concepções adotadas pelos órgão superiores no decorrer dos anos.
Tratando-se da aprendizagem integral da criança, segundo Oliveira (2005): “... já está suficientemente claro, hoje, que as crianças, desde pequenas, podem avançar no processo de letramento. A criança nasce em um mundo onde estão presentes sistemas simbólicos diversos socialmente elaborados. Em especial, ela vive em um mundo letrado, diferente dos povos primitivos que constituíam sociedades ágrafas, ou seja, sem escrita. Desde que inserida em um ambiente propício, ela vai-se apropriando dos principais “canais de notação” característicos de nossa cultura (...)”. Problematizar o sentido da Educação Infantil(4) no contexto pedagógico será também uma de nossas finalidades no decorrer deste curso, cujo produto se constitui de nove lições: inicialmente, abordamos o histórico da educação infantil e citamos os principais educadores que contribuíram para a prática do trabalho nas instituições, numa perspectiva histórica e de transformações, focalizando o atendimento a crianças de 0-6 anos, de modo a destacar a implicação das teorias e concepções.
Depois, destacamos os fundamentos legais para a educação infantil, mostrando as exigências de qualidade presentes nas diretrizes e nos documentos oficiais que norteiam o funcionamento de instituições que atendem a criança pequena.
Por fim, discorremos sobre a Gestão da Educação infantil: do assistencialismo ao pedagógico; rotina versus educativo; atribuições e competências dos profissionais da educação infantil e a proposta pedagógica no contexto atual, complementando com o relato de experiência ocorrido na década de 90 em uma das instituições mantidas pela Secretaria do Menor.
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1 A Educação Infantil é a primeira etapa da Educação Básica e destina-se à criança de zero a cinco anos de idade, não sendo obrigatória, mas um direito a que o Estado tem o dever de atender (cf. LDB, artigo 29).
2 ver referências bibliográficas
3 Os docentes da Educação Infantil devem ser formados em cursos de nível superior (licenciatura de graduação plena), admitida como formação mínima a oferecida em nível médio (modalidade normal) (cf. LDB, artigo 62).
O docente de Educação Infantil tem a função de educar e cuidar de forma integrada da criança na faixa de zero a seis anos de idade. (MEC,1998)
4 A Educação infantil orienta-se pelos princípios da educação em geral: igualdade de condições para o acesso e permanência na escola; liberdade de aprender, ensinar, pesquisar e divulgar a cultura, o pensamento, a arte e o saber; pluralismo de idéias e de concepções pedagógicas; respeito à liberdade e apreço à tolerância; coexistência de instituições públicas e privadas de ensino; gratuidade do ensino público em estabelecimentos oficiais; valorização do profissional da educação escolar; gestão democrática do ensino público, na forma da Lei e da legislação dos sistemas de ensino; garantia de padrão de qualidade; valorização da experiência extra-escolar; vinculação entre educação escolar e as práticas sociais (cf. LDB, artigo 3º).

2a. Lição: A Trajetória da Educação Infantil no Brasil

Estudos mostram que até o início da República muito pouco se fazia no Brasil em relação a criança de 0 a 6 anos. Mudanças sociais e políticas ocorridas no cenário nacional, a partir dos anos 20 do século XX , impulsionaram um maior reconhecimento do setor público quanto à importância do atendimento à criança. A tônica era a medicalização da assistência à criança até 6 anos; até então a preocupação era apenas o cuidar fisicamente. Após a década de 1930, a “causa da criança” mobiliza autoridades oficiais e iniciativas particulares; surgindo a criação de várias instituições voltadas à criança; desde este período, a história do atendimento público é constituído de uma rede que envolve diferentes Ministérios: Saúde, Previdência e Assistência Social e Educação. O problema da criança é fragmentado e combatido de forma isolada – a saúde, “bem estar” da família, a educação (resultado: Ninguém é realmente responsável, uma área de atuação responsabiliza a outra).
Em 1975 é criada a Coordenação de Educação Pré-escolar (COEPRE) do MEC; cujo objetivo era incentivar as Secretarias de Educação a criarem as Coordenações voltadas à pré-escola – a pré-escola é proclamada como solução para os problemas do 1º grau. No ano de 1979 é comemorado “O Ano Internacional da Criança” e leva a Temática da infância aos meios de comunicação em massa; nesta época passa-se a criação oficial do Movimento de luta por creches. (I Congresso da Mulher Paulista).
No ano de 1981 é lançado o Programa Nacional de Educação Pré-escolar; com dupla estratégia: primeiro são realizados convênios entre as Secretarias Estaduais de Educação e MEC/ COEPRE, com a prioridade de expandir a pré-escola – baixo custo, grandes espaços (100 e 120 crianças), utilizando mães voluntárias; e o segundo o MOBRAL5 que é 5 MOBRAL MOVIMENTO BRASILEIRO DE ALFABETIZAÇÃO “convidado” a integrar o Programa Nacional, realizando atendimento ao pré. Durante os anos de 1981/1982 a educação pré-escolar se torna o programa prioritário do MEC e do MOBRAL.
A Partir de 1982, das eleições municipais e estaduais diversificaram-se as políticas mas não se destina recursos humanos e financeiros necessários para uma atuação de qualidade. O MOBRAL é extinto em 1985 e é criada a Fundação Educar (atende apenas adultos); a préescola é transferida para a Secretaria de Ensino do 1º e 2º graus (SEPS). Em 1987 é extinta a COEPRE. O Programa Pré-escolar passa a ser coordenado pela Secretaria de ensino básico do MEC, inserido no setor de ensino de 1º grau e supletivo. Com a Constituição Brasileira de 1988, há o intenso debate sobre a educação pré-escolar.
Com a LDB (Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional) nº 9394 de 1996, a legislação nacional passa a reconhecer que as creches e pré-escola, para crianças de 0 a 6 anos, são parte do sistema educacional – 1ª etapa da educação básica. Deixa a cargo dos Municípios e Estados a responsabilidade pela inclusão e transformação do sistema.
Percebe-se no decorrer estes anos que as instituições de educação infantil vem sofrendo significativas transformações decorrentes de um conjunto de fatores:
- A intensificação da urbanização.
- A participação da mulher no mercado de trabalho.
- As modificações na organização e estrutura familiar.
- O processo de redemocratização.
A história da educação infantil em nosso país tem, de certa forma, acompanhado a história dessa área no mundo, havendo, é claro, características que lhe são próprias. Até meados do século XIX, o atendimento de crianças pequenas infantis praticamente não existia no Brasil. No meio rural, onde residia a maior parte da população do país na época, famílias de fazendeiros assumiam o cuidado das inúmeras crianças órfãs ou abandonadas, geralmente frutos da exploração sexual da mulher negra e índia pelo senhor branco. Já na zona urbana, bebês abandonados pelas mães, por vezes filhos ilegítimos de moças pertencentes a famílias com prestígio social, eram recolhidos nas “rodas de expostos” existentes em algumas cidades desde o início do século XVIII.
Essa situação vai se modificar um pouco a partir da segunda metade do século XIX, período da abolição da escravatura no país, quando se acentua a migração para a zona urbana das grandes cidades e surgem condições para certo desenvolvimento cultural e tecnológico e para a proclamação da República como forma de governo.
A idéia de “jardim-de-infância”, todavia, gerou muitos debates entre os políticos da época; muitos a criticavam por identificá-la com as salas de asilo francesas, entendidas como locais de mera guarda das crianças. Outros a defendiam por acreditarem que trariam vantagens para o desenvolvimento infantil, sob a influência dos escolanovistas. O cerne da polêmica era a argumentação de que, se os jardins-de-infância tinham objetivos de caridade e destinavam-se aos mais pobres, não deveriam ser mantidos pelo poder público.
Na Exposição Pedagógica, realizada em 1885 no Rio de Janeiro, os jardins-de-infância foram ora confundidos com as salas de asilo francesas, ora entendidos como início (perigoso) de escolaridade precoce. Eram considerados prejudiciais à unidade familiar por tirarem desde cedo a criança de seu ambiente doméstico, sendo admitidos apenas no caso de proteção aos filhos de mães trabalhadoras.
Nesse momento já aparecem algumas posições históricas em face da educação infantil que iriam se arrastar até hoje: o assistencialismo e uma educação compensatória aos desafortunados socialmente. Planejar um ambiente promotor da educação era meta considerada com dificuldade.
As “criadeiras”, como eram chamadas, foram estigmatizadas como “fazedoras de anjos”, em conseqüência da alta mortalidade das crianças por elas atendidas, explicada na época pela precariedade de condições higiênicas e materiais e – acrescentaríamos hoje – pelos problemas psicológicos advindos de inadequada separação da criança pequena de sua família.
As poucas conquistas ocorridas em algumas regiões operárias não se deram sem conflitos. As reivindicações operárias, dirigidas inicialmente aos donos de indústrias, foram sendo, com o tempo, canalizadas para o Estado e atuaram como força de pressão pela criação de creches, escolas maternais e parques infantis por parte dos órgãos governamentais. Em 1923, a primeira regulamentação sobre o trabalho da mulher previa a instalação de creches e salas de amamentação próximas do ambiente de trabalho e que estabelecimentos comerciais e indústrias deveriam facilitar a amamentação durante a jornada das empregadas.
Em 1924, educadores interessados no Movimento das Escolas Novas fundaram a Associação Brasileira de Educação. Em 1929, Lourenço Filho publicou o livro Introdução ao estudo da Escola Nova, divulgando as novas concepções entre os educadores brasileiros. Em 1932, surgiu o Manifesto dos Pioneiros da Educação Nova, documento que defendia amplo leque de pontos: a educação como função pública, a existência de uma escola única e da coeducação de meninos e meninas, a necessidade de um ensino ativo nas salas de aula e de o ensino elementar ser laico, gratuito e obrigatório. As intervenções educacionais propostas seriam parte de um processo de luta pela cultura historicamente elaborada.
Entre outros pontos então discutidos nesse período de renovação do pensamento educacional estava a educação pré-escolar, instituída como a base do sistema escolar.
Outra iniciativa, de 1923, foi a fundação da Inspetoria de Higiene Infantil, que, em 1934, foi transformada em Diretoria de Proteção à maternidade e à Infância.
O governo Vargas (1930-1945), ao mesmo tempo em que resguardava os interesses patrimoniais, reconheceu alguns direitos políticos dos trabalhadores por meio de legislações específicas, como a Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, de 1943.
Embora desde a década de 30 já tivessem sido criadas algumas instituições oficiais voltadas ao que era chamado de proteção à criança, foi na década de 40 que prosperaram iniciativas governamentais na área da saúde, previdência e assistência. O atendimento fora da família aos filhos que ainda não freqüentassem o ensino primário era vinculado a questões de saúde.
Entendidas como “mal necessário”, as creches eram planejadas como instituições de saúde, com rotinas de triagem, lactário, pessoal auxiliar de enfermagem, preocupação com a higiene do ambiente físico. Por trás disso, buscava-se regular todos os atos da vida, particularmente dos membros das camadas populares. Para tanto, multiplicaram-se os convênios com instituições filantrópicas a fim de promover o aleitamento materno e combater a mortalidade infantil. No imaginário da época, a mãe continuava sendo a dona do lar, devendo limitar-se a ele.
A preocupação era alimentar, cuidar da higiene e da segurança física, sendo pouco valorizado um trabalho orientado à educação e ao desenvolvimento intelectual e afetivo das crianças. Assim, de forma desintegrada, ocorria o atendimento às crianças em creches, parques infantis, escolas maternais, jardins-de-infância e classes pré-primárias.
Em 1942, o Departamento Nacional da Criança, então parte do Ministério da Educação e Saúde, criou a “Casa da Criança”. O discurso médico continuava em destaque, mas já modificado pela preocupação de certos grupos sociais com a organização de instituições para evitar a marginalidade e a criminalidade de vastos contingentes de crianças e jovens da população mais carente. Em 1953, com a divisão daquele ministério, o Departamento Nacional da Criança passou a integrar o Ministério da Saúde, sendo substituído em 1970 pela Coordenação de Proteção Materno-Infantil.
Embora os textos oficiais do período recomendassem que também as creches, além dos jardins-de-infância, contassem com material apropriado para a educação das crianças, o atendimento em creches e parques infantis continuou a ser realizado de forma assistencialista.
Uma mudança importante havia ocorrido, no entanto, no início desse período: a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional aprovada em 1961 (Lei 4024/61) aprofundou a perspectiva apontada desde a criação dos jardins-de-infância: sua inclusão no sistema de ensino. Assim dispunha essa lei:
Art.23 – “A educação pré-primária destina-se aos menores de até 7 anos, e será ministrada em escolas maternais ou jardins-de-infância”.
Art. 24 – “As empresas que tenham a seu serviço mães de menores de sete anos serão estimuladas a organizar e manter, por iniciativa própria ou em cooperação com os poderes públicos, instituições de educação pré-primária”.
No período dos governos militares pós 1964, as políticas adotadas em nível federal, por intermédio de órgãos como o Departamento Nacional da Criança, a Legião Brasileira de Assistência e a Fundação Nacional do Bem-Estar do Menor – Funabem, continuaram a divulgar a idéia de creche e mesmo de pré-escola como equipamentos sociais de assistência à criança carente.
Novas mudanças na Consolidação das Leis do Trabalho, ocorridas em 1967, trataram o atendimento aos filhos das trabalhadoras apenas como uma questão de organização de berçários pelas empresas, abrindo espaço para que outras entidades, afora a própria empresa empregadora da mãe, realizassem aquela tarefa por meio de convênios. O poder público, contudo, não cumpriu o papel de fiscal da oferta de berçários pelas empresas. Assim, poucas creches e berçários foram nelas organizados.
A nova legislação vigente sobre o ensino formulada em 1971 (Lei 5692) trouxe novidades à área, ao dispor que: “Os sistemas velarão para que as crianças de idade inferior a 7 anos recebam educação em escolas maternais, jardins-de-infância ou instituições equivalentes”.
Conceitos como carência e marginalização cultural e educação compensatória foram então adotados, sem que houvesse uma reflexão crítica mais aprofundada sobre as raízes estruturais dos problemas sociais. Isso passou a influir também nas decisões de políticas de educação infantil.
Assim, sob o nome de “educação compensatória”, foram sendo elaboradas propostas de trabalho para as creches e pré-escolas que atendiam a população de baixa renda. Tais propostas visavam à estimulação precoce e ao preparo para a alfabetização, mantendo, no entanto, as práticas educativas geradas por uma visão assistencialista da educação e do ensino.
Nem tudo era harmonioso nesse processo. Enquanto discursos compensatórios ou assistencialistas continuavam dominantes no trabalho nos parques que atendiam filhos de operários e nas creches que cuidavam das crianças de famílias de baixa renda, propostas de desenvolvimento afetivo e cognitivo para crianças eram adotadas pelos jardins-de-infância onde eram educadas as crianças de classe média.
A referida pressão da demanda por pré-escola e os polêmicos debates acerca de sua natureza – assistencial versus educativa -, na segunda metade dos anos 70, dinamizaram as decisões na área. Em 1974, o Ministério de Educação e Cultura criou o Serviço de Educação Pré-Escolar e, em 1975, a Coordenadoria de Ensino Pré-Escolar. O Projeto Casulo foi organizado em muitos municípios brasileiros, atendendo, em período de quatro ou oito horas diárias, um número gigantesco de crianças: 300 mil crianças, com prioridade para as mais velhas, em 1981, e 600 mil crianças em 1983 (Campos, 1985).
O governo federal também se utilizou da Fundação Mobral para competir com LBA pela mesma clientela infantil. Tal fundação coordenou programas de atividades para a formação de hábitos, habilidades e atitudes que eram supervisionados por monitoras com pouca escolaridade. Iniciativas como essas, no contexto da época, serviram para amenizar desigualdades e assistir necessidades básicas, e não para promover aprendizagem.
Ao mesmo tempo, negociações trabalhistas ocorridas no período que antecedeu a elaboração da Constituição de 1988, surgiram a discussão acerca do atendimento aos filhos dos trabalhadores e resultaram em maior número de creches mantidas por empresas industriais e comerciais e por órgãos públicos para os filhos de seus funcionários, bem como na concessão, por parte de algumas empresas, de uma ajuda de custo às funcionárias com crianças pequenas, para pagarem creches particulares de sua livre escolha.
Mesmo assim, a insuficiência do número de crianças atendidas nas creches pressionava o poder público a incentivar outras iniciativas de atendimento à criança pequena.
Eram as “mães crecheiras”, os “lares vicinais”, “creches domiciliares” ou “creches lares”, programas assistenciais de baixo custo estruturados com a utilização de recursos comunitários, tal como ocorria em muitos países do chamado Terceiro Mundo. Tais formas de atendimento, das quais a comunidade carente já lançava mão fazia tempo, constituíram alternativas emergenciais e inadequadas, dada a precariedade de sua realização.
Com o término do período militar de governo, em 1985, novas políticas para as creches foram incluídas no Plano Nacional de Desenvolvimento, elaborado em 1986.
Começava a ser admitida a idéia de que a creche não dizia respeito apenas à mulher ou a família, mas também ao Estado e às empresas. A questão foi cada vez mais incluída nas campanhas eleitorais de candidatos a prefeitos e governadores nos anos de 1985 e 1986 e no plano de governo de muitos dos eleitos.
Lutas pela democratização da escola pública, somadas a pressões de movimentos feministas e de movimentos sociais de lutas por creches, possibilitaram a conquista, na Constituição de 1988, do reconhecimento da educação em creches e pré-escolas como um direito da criança e um dever do Estado a ser cumprido nos sistemas de ensino.
Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, que determinou que 50% da aplicação obrigatória de recursos em educação fosse destinada a programas de alfabetização – em um momento, em que era defendida a alfabetização de crianças em idade anterior à do ingresso no ensino obrigatório -, houve expansão do número de pré-escolas e alguma melhoria no nível de formação de seus docentes, muitas vezes já incluídos em quadros de magistério. O filhote esquecido nessa expansão era a creche; que, embora reconhecida como instituição educacional, permanecia muito identificada com a idéia de favor e de situação de exceção.
A década de 90 assistiu a alguns novos marcos. Um deles foi a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente em 1990, que concretizou as conquistas dos direitos das crianças promulgados pela Constituição. Na área da educação infantil, o debate que acompanhou a discussão de uma nova Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) na Câmara de Deputados e no Senado Federal impulsionou diferentes setores educacionais, particularmente universidades e instituições de pesquisa, sindicatos de educadores e organizações não-governamentais, à defesa de um novo modelo de educação infantil.
Após a promulgação da LDB, foram criados fóruns estaduais e regionais de educação infantil como espaços de reivindicações por mais verbas para programas de formação profissional para professores dessa área. Um Referencial Curricular Nacional foi formado pelo MEC e Diretrizes Nacionais para a Educação Infantil foram definidos pelo Conselho Nacional de Educação. Esses pontos, contudo, estão ainda longe de representar uma transformação das práticas didáticas em curso nas creches e pré-escolas.
Segundo o MEC (1993), “A Educação Infantil, primeira etapa da educação básica, embora tenha mais de um século de história, como cuidado e educação extradomiciliar, somente nos últimos anos foi reconhecida como direito da criança, das mães e dos pais trabalhadores e como dever do Estado.(...)Tradicionalmente, na educação de crianças de 0 a 3 anos predominam os cuidados em relação à saúde, higiene e alimentação, enquanto a educação das crianças de 4 a 6 anos tem sido concebida e tratada como antecipadora/preparatória para o Ensino Fundamental.
Esses fatos explicam, em parte, algumas das dificuldades atuais de lidar com a Educação Infantil na perspectiva da integração de cuidados e educação em creches e pré-escolas e também na continuidade com as primeiras séries do Ensino Fundamental. Na Constituição Federal de 1988, a educação das crianças de 0 a 6 anos, concebida, muitas vezes, como amparo e assistência, passou a figurar como direito do cidadão e dever do Estado, numa perspectiva educacional, em resposta aos movimentos sociais em defesa dos direitos das crianças. Nesse contexto, a proteção integral às crianças deve ser assegurada, com absoluta prioridade, pela família, pela sociedade e pelo poder público. A Lei afirma, portanto, o dever do Estado com a educação das crianças de 0 a 6 anos de idade. A inclusão da creche no capítulo da Educação explicita a função eminentemente educativa desta, da qual é parte intrínseca a função de cuidar. Essa inclusão constituiu um ganho, sem precedentes, na história da Educação Infantil em nosso país. A década de 1990 iniciou-se sob a égide do dever do Estado perante o direito da criança à educação, explicitando as conquistas da Constituição de 1988. Assim, em 1990, no Estatuto da Criança e do Adolescente foram reafirmados esses direitos, ao mesmo tempo em que foram estabelecidos mecanismos de participação e controle social na formulação e na implementação de políticas para a infância. Em 1994, o Ministério da Educação coordenou a elaboração do documento de Política Nacional de Educação Infantil, no qual se definem como principais objetivos para a área a expansão da oferta de vagas para a criança de 0 a 6 anos, o fortalecimento, nas instâncias competentes, da concepção de educação e cuidado como aspectos indissociáveis das ações dirigidas às crianças e a promoção da melhoria da qualidade.
Nos documentos oficiais, percebemos o empenho e boas intenções nas propostas para a educação infantil, mas é preciso ter uma postura transdisciplinar e ir além das teorias, colocando em prática os princípios fundamentais para garantir e oportunizar a criança no seu ambiente de aprendizagem o crescimento sadio: físico, emocional e intelectual.

3a. Lição: Os pensadores que influenciaram na concepção da educação infantil

Pensadores como Comênio, Rousseau, Pestalozzi, Decroly, Froebel e Montessori (1), entre outros, estabeleceram as bases para um sistema de ensino mais centrado na criança.
Muitos deles achavam-se compromissados com questões sociais relativas a crianças que vivenciavam situações sociais críticas (órfãos de guerra, pobreza) e cuidaram de elaborar propostas de atividades em instituições escolares que compensassem eventuais problemas de desenvolvimento. Embora com ênfases diferentes entre si, as propostas de ensino desses autores reconheciam que as crianças tinham necessidades próprias e características diversas das dos adultos, como o interesse pela exploração de objetos e pelo jogo.
Para Oliveira (2005) “ Ao longo de muitos séculos, o cuidado e a educação das crianças pequenas foram entendidos como tarefas de responsabilidade familiar, particularmente da mãe e de outras mulheres. O recorte em favor da família como a matriz educativa preferencial aparece também nas denominações das instituições de guarda e educação da primeira infância. O termo francês creche equivale à manjedoura, presépio. O termo italiano asilo indica um ninho que abriga. Escola materna foi outra designação usada para referir-se ao atendimento de guarda e educação fora da família a crianças pequenas. Até a criação de rodas – cilindros ocos de madeira, giratórios, construídos em muros de igrejas ou hospitais de caridade que permitiam que bebês fossem neles deixados sem que a identidade de quem os trazia precisasse ser identificada para recolhimento dos expostos ou a deposição de crianças abandonadas em lares substitutos, já na Idade Média e Moderna”.
Nos séculos XV e XVI, novos modelos educacionais foram criados para responder aos desafios estabelecidos pela maneira como a sociedade européia então se desenvolvia. Autores como Erasmo (1465-1530) e Montaigne (1483-1553) sustentavam que a educação deveria respeitar a natureza infantil, estimular a atividade da criança e associar o jogo à aprendizagem.
Gradativamente, surgiram arranjos mais formais para atendimento de crianças fora da família em instituições de caráter filantrópico, especialmente delineadas para esse objetivo e que organizavam as condições para o desenvolvimento infantil segundo a forma como o destino social da criança atendida era pensado.
Educar crianças menores de 6 anos de diferentes condições sociais já era uma questão tratada por COMÊNIO (1592-1670), educador e bispo protestante checo. Em seu livro “A escola da infância”, publicado em 1628, afirmava que o nível inicial de ensino era o “colo da mãe” e deveria ocorrer dentro dos lares. Em 1637 elaborou um plano de escola maternal em que recomendava o uso de materiais audiovisuais, como livros de imagens, para educar crianças pequenas.
Já em 1657 Comênio usou a imagem de “jardim-de-infância (onde “arvorezinhas plantadas”, seriam regadas) como o lugar da educação das crianças pequenas.
Em oposição ao ideário da Reforma e da Contra – reforma religiosa então em curso na Europa, o filósofo genebrino Jean Jacques ROUSSEAU (1712-1778) criou uma proposta educacional em que combatia preconceitos, autoritarismos e todas as instituições sociais que violentassem a liberdade característica da natureza. Ele destacava o papel da mãe como educadora natural da criança.
ROUSSEAU revolucionou a educação de seu tempo ao afirmar que a infância não era apenas uma via de acesso, um período de preparação para a vida adulta, mas tinha valor em si mesma; propunha que a educação seguisse a liberdade e o ritmo da natureza, contrariando os dogmas religiosos da época, que preconizavam o controle dos infantes pelos adultos.
Defendia uma educação não orientada pelos adultos, mas que fosse resultado do livre exercício das capacidades infantis e enfatizasse não o que a criança tem permissão para saber, mas o que é capaz de saber.
As idéias de Rousseau abriram caminho para as concepções educacionais do suíço PESTALOZZI (1746-1827), que também reagiu contra o intelectualismo excessivo da educação tradicional. Educar deveria ocorrer em um ambiente o mais natural possível, num clima de disciplina estrita, mas amorosa, e pôr em ação o que a criança já possui dentro de si, contribuindo para o desenvolvimento do caráter infantil. Pestalozzi destacou ainda o valor educativo do trabalho manual e a importância de a criança desenvolver destreza prática.
Também se preocupou com a idéia de que a educação deveria ser metodicamente ordenada para os sentidos: a percepção da criança seria educada pela intuição e o ensino deveria priorizar coisas, não palavras. Sua pedagogia enfatizava ainda a necessidade de a escola treinar a vontade e desenvolver as atitudes morais dos alunos.
As idéias de Pestalozzi foram levadas adiante por FROEBEL (1782-1852), educador alemão. Influenciado por uma perspectiva mística, uma filosofia espiritualista e um ideal político de liberdade, criou em 1837 um Kindergarten (jardim-de-infância) onde crianças e adolescentes – pequenas sementes que, adubadas e expostas a condições favoráveis em seu meio ambiente, desabrochariam sua divindade interior em um clima de amor, simpatia e encorajamento – estariam livres para aprender sobre si mesmo e sobre o mundo. O modo básico de funcionamento de sua proposta educacional incluía atividades de cooperação e o jogo, entendidos como a origem da atividade mental.
Elaborou canções e jogos para educar sensações e emoções, enfatizou o valor educativo da atividade manual, confeccionou brinquedos para a aprendizagem da aritmética e da geometria, além de propor que as atividades educativas incluíssem conversas e poesias e o cultivo da horta pelas crianças. Os recursos pedagógicos, básicos neste modelo, eram divididos em dois grupos: as prendas ou dons e as ocupações.
As prendas eram materiais que não mudavam de forma – cubos, cilindros, bastões e que, usados em brincadeiras, possibilitariam à criança fazer construções variadas e formar um sentido da realidade e um respeito à natureza.
Já as ocupações consistiam em materiais que se modificavam com o uso – tais como argila, areia e papel usados em atividades de modelagem, recorte, dobradura, alinhavo em cartões com diferentes figuras desenhadas, etc.
Canções completariam essa lista de materiais e atividades. As prendas e as ocupações se articulariam pela mediação da educadora na formação da livre expressão infantil, ou seja, daquilo que Froebel, dentro de seu quadro ideológico, chamou de “atividade materna”.
A ênfase posta por ele na liberdade da criança, espelhando movimentos liberais em curso na Europa, passou a ser vista como ameaçadora ao poder político alemão, o que levou o autoritarismo governamental da época a fechar os jardins-de-infância do país por volta de 1851. As sementes da renovação educacional pensada por Froebel, proibida na Alemanha, encontraram solo fértil em outros países. A sistematização de atividades para crianças pequenas com o uso de materiais especialmente confeccionados foi realizada por dois médicos interessados pela educação.
DECROLY (1871-1932), médico belga, trabalhando com crianças excepcionais, elaborou, em 1901, uma metodologia de ensino que propunha atividades didáticas baseadas na idéia de totalidade do funcionamento psicológico e no interesse da criança, adequadas ao sincretismo que ele julgava ser próprio do pensamento infantil. Decroly defendia um ensino voltado para o intelecto.
Nos centros de interesse, o trabalho se estruturaria segundo três eixos: observação, associação e expressão. Decroly é conhecido ainda por defender rigorosa observação dos alunos a fim de poder classificá-los e distribuí-los em turmas homogêneas. O nome da médica psiquiatra italiana Maria MONTESSORI (1879-1952) inclui-se também nas lista dos principais construtores de propostas sistematizadas para a educação infantil no século XX.
Em 1907, foi convidada a organizar uma sala para educação de crianças sem deficiências dentro de uma habitação coletiva destinada a famílias dos setores populares, experiência que denominou “Casa das Crianças”.
Ao contrário de Rousseau, que defendia a auto-educação, Montessori não aceitava a natureza como ambiente apropriado para o desenvolvimento infantil. Antes, era a favor da criação de um contexto que fosse adequado às possibilidades de cada criança e estimulasse seu desenvolvimento. Montessori teve como marca distintiva a elaboração de materiais adequados a exploração sensorial pelas crianças e específicos ao alcance de cada objetivo educacional. Seu material didático buscava fazer um detalhamento rigoroso do conteúdo a ser trabalhado com as crianças e previa exercícios destinados a desenvolver, passo a passo, as diversas funções psicológicas.
Sua proposta desviava a atenção do comportamento de brincar para o material estruturador da atividade própria da criança: o brinquedo. Montessori criou instrumentos especialmente elaborados para a educação motora (ligados, sobretudo à tarefa de cuidado pessoal) e para a educação dos sentidos e da inteligência – por exemplo, letras móveis, letras recortadas em cartões-lixa para aprendizagem de leitura, contadores, como o ábaco, para aprendizado de operações com números.
Foi ainda quem valorizou a diminuição do tamanho do mobiliário usado pelas crianças nas pré-escolas e a exigência de diminuir os objetos domésticos cotidianos a serem utilizados para brincar na casinha de boneca. No campo da Psicologia, uma série de autores oferecia novas formas de compreender e promover o desenvolvimento das crianças pequenas.
Vygotsky, na década de 20 e 30, atestava que a criança é introduzida na cultura por parceiros mais experientes. Ainda na primeira metade do século XX, Wallon destacava o valor da afetividade na diferenciação que cada criança aprende a fazer entre si mesma e os outros.
Os psicanalistas reconheciam que o comportamento infantil deveria ser interpretado, e não meramente aceito em seus aspectos observáveis. Finalmente, há que mencionar as pesquisas de Piaget e colaboradores que revolucionaram a idéia dominante sobre a criança.
Novos protagonistas destacaram-se ainda na primeira metade do século XX. Celestin FREINET (1896-1966) foi um dos educadores que renovaram as práticas pedagógicas de seu tempo. Para ele, a educação que a escola dava às crianças deveria extrapolar os limites da sala de aula e integrar-se às experiências por elas vividas em seu meio social. A seu ver, as atividades manuais e intelectuais permitem a formação de uma disciplina pessoal e a criação do trabalho-jogo, que associa atividade e prazer e é por ele encarado como eixo de uma escola popular. A pedagogia de Freinet organiza-se ao redor de uma série de técnicas ou atividades, entre elas as aulas-passeio, o desenho livre, o texto livre, o jornal escolar, a correspondência inter-escolar, o livro da vida. Apesar de ele não ter trabalhado diretamente com crianças pequenas, sua experiência teve lento, mas marcante impacto sobre as práticas didáticas em creches e pré-escolas em vários países.
A defesa da brincadeira como recurso para o desenvolvimento infantil levou pais de classe média a buscar a organização de play groups, algumas horas por semana, para atendimento de seus filhos pequenos, embora ainda dentro da perspectiva tradicional no que se refere ao papel privilegiado da família na educação dos filhos. A atual etapa reconhece o direito de toda a infância.
Trata-se como “sujeito social” ou “ator pedagógico” desde cedo, agente construtor de conhecimentos e sujeito de autodeterminação, ser ativo na busca do conhecimento, da fantasia e da criatividade, que possui grande capacidade cognitiva e de sociabilidade e escolhe com independência seus itinerários de desenvolvimento. Para as crianças, cada vez mais são produzidos brinquedos educativos e literatura própria. A primeira infância constitui, assim, um campo mercadológico: brinquedos, roupas, discos, espetáculos, espaços públicos e até pedagogias.
Alguns pontos, contudo, são comuns. O debate não está mais centrado em se deve haver investimento na área de educação infantil, mas em por que e para quem ela existe e como organizá-la para oferecer serviços de qualidade. O acolhimento a crianças pequenas em instituições como creches e pré-escolas varia de país para país.
Em alguns países a pré-escola está ligada a escola primária, embora com modelos diferentes, ora centrados no desenvolvimento infantil, ora na preparação para atividades mais formalizadas. Pesquisas em diferentes países, particularmente na Europa ocidental e nos Estados Unidos, mas também no Japão, na Coréia, na Nova Zelândia, etc, revelam que o fato de a criança freqüentar uma instituição de educação infantil amplia suas condições de desenvolvimento cognitivo, físico, afetivo e de socialização, embora essa vantagem se torne menos visível com o decorrer do tempo. As crianças pequenas que se beneficiam de um serviço de qualidade tendem a desenvolver mais o raciocínio e a capacidade de solução de problemas, a ser mais cooperativas e atentas aos outros e a adquirir maior confiança em si.
Segundo algumas pesquisas realizadas, cresce a consciência, no mundo inteiro, sobre a importância da educação das crianças de 0 a 6 anos, em estabelecimentos específicos com orientações e práticas pedagógicas apropriadas, como decorrência das transformações socioeconômicas verificadas nas últimas décadas, e também apoiada em fortes argumentos consistentes advindos das ciências que investigam o processo de desenvolvimento da criança.
Na última década, várias foram as mudanças ocorridas na legislação brasileira que define a garantia de atenção às crianças de 0 a 6 anos, configurando-se mesmo, num novo ordenamento legal, iniciado pela Constituição Federal de 1988 e consolidando, por assim dizer, com a promulgação da nova LDB 9394/96. Ao menos no papel, esse novo ordenamento caracteriza-se por uma concepção de atenção à criança atribuindo-lhe a condição de cidadã, cujo direito à proteção integral deve ser assegurado pela família, pela sociedade e pelo poder público, com absoluta prioridade.
Para Emília Ferreiro (2004), em relação a sua pesquisa que muito colaborou nas discussões realizadas no Brasil na década de 80, principalmente na contrução de novas idéias sobre o desenvolvimento e aprendizagem da criança; vale a pena citar a fala dela em uma das suas entrevistas: “A minha contribuição foi encontrar uma explicação segundo a qual, por trás da mão que pega o lápis, dos olhos que olham, dos ouvidos que escutam, há uma criança que pensa”.
E é neste contexto que vislumbramos a necessidade de se trabalhar a educação infantil de forma mais abrangente, levando em consideração o contexto social, conhecendo e valorizando as diferenças individuais e os ritmos de aprendizagem de cada indivíduo na sua trajetória de formação epistemológica, dando a verdadeira atenção a educação infantil como primeira etapa da educação básica.

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1 - Os fragmentos sobre os pensadores foram retirados de NICOLAU, Marieta L. M. A educação Pré-escolar: fundamentos e didática. 9. ed. São Paulo: Ática, 1997.

4a. Lição: Fundamentos Legais para a Educação Infantil

A Constituição de 1988, inciso IV do artigo 208, afirma: O dever do Estado com a educação será efetivado mediante garantia de (...) atendimento em creche e pré-escola às crianças de zero a seis anos de idade. Com a inclusão da creche no capítulo da Educação, a Constituição explicita a função eminentemente educativa da mesma, à qual se agregam as ações de cuidado. O Estatuto da Criança e do Adolescente, no capítulo IV, Art.53, inciso IV, reafirma esse direito constitucional: É dever do Estado assegurar à criança e ao adolescente: (...) atendimento em creche e pré-escola às crianças de 0 a 6 anos de idade.
A Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (Lei Nº 9.394), de 20 de dezembro de 1996, reproduz, também o inciso da Constituição Federal no Art.4º do Titulo III (Do Direito À Educação E Do Dever De Educar). Quando trata da Composição dos Níveis Escolares, no Art.21, a LDB explicita: A educação escolar compõe-se de: I - Educação básica, formada pela educação infantil, ensino fundamental e ensino médio; (...). No capítulo sobre a Educação Básica, Seção II, trata especificamente da Educação Infantil, nos seguintes termos:
Art. 29. A educação infantil, primeira etapa da educação básica, tem como finalidade o desenvolvimento integral da criança até seis anos de idade, em seus aspectos físico, psicológico, intelectual e social, complementando a ação da família e da comunidade.
Art. 30. A educação infantil será oferecida em:
I - creches, ou entidades equivalentes, para crianças de até três anos de idade;
II - pré-escolas, para as crianças de quatro a seis anos de idade.
Art. 31. Na educação infantil a avaliação far-se-á mediante acompanhamento e registro do seu desenvolvimento, sem o Objetivo de promoção, mesmo para o acesso ao ensino fundamental.
Segundo Kramer (2002) no artigo intitulado “Educação infantil como direito”:
“Educação infantil como direito se configura como conquista a partir de muitas e longas lutas na história da sociedade brasileira. De 1975, quando da realização do primeiro Diagnóstico Nacional da Educação Pré-escolar, feito pelo MEC, passando por 1979 – Ano Internacional da Criança -, pela Constituinte de 1988, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente de 1990, até a Lei de Diretrizes e bases da Educação Nacional de 1996, trata-se da conquista de uma visão das crianças enquanto cidadãos de direitos, inclusive o direito à educação infantil. Mas devemos atender as crianças porque é lei?
Não; trata-se de educação na sua função precípua de formar a geração. Mais do que tudo, está em jogo a nossa responsabilidade social – enquanto professores, mulheres e homens, cidadãos – de tratarmos as crianças como cidadãs de pequena idade, instituindo alternativas diversas de socialização para todas e abrindo espaços para as crianças nas mais diferentes instituições já existentes.
Por outro lado, no campo das políticas direcionadas à infância temos tido historicamente avanços, retrocessos e impasses, ganhando muitas vezes no discurso, perdendo, contudo, nas ações concretas”.

As exigências colocadas pela Lei de Diretrizes e Bases da Educação determinam uma reorganização dos sistemas de ensino. A transferência das creches da assistência para a educação, por exemplo, implica o estabelecimento de normas e regulamentações para o credenciamento e funcionamento das mesmas e, conseqüentemente, para a realização da supervisão, acompanhamento, controle e avaliação por parte dos sistemas de ensino.
Em 1998, o MEC publicou o documento “Subsídios para credenciamento e funcionamento de instituições de educação infantil”, visando contribuir para a elaboração dessas normas pelos conselhos municipais e estaduais de educação. Atualmente percebe-se que muitas instituições de educação infantil estão em processo de reorganização, pois desconheciam as propostas publicadas pelo Mec, e as novas exigências com relação a formação adequada de profissionais para atuarem na educação infantil conforme prevê a LDB 9.394/96.
A integração das creches e pré-escolas nos sistemas de ensino, exigida pela Lei 9.394/96, ampliou o debate sobre o que seria proposta pedagógica para essas instituições; ampliando, assim, as discussões fundamentadas nos subsídios teóricos visando uma prática contextualizada e coerente nos diferentes segmentos do cotidiano das instituições que atendem a criança pequena.

*** Clique no link abaixo para abrir a Lei 12.796, de 4 de Abril de 2013, que altera a Lei 9.394 de 20 de Dezembro de 1996:

5a. Lição: Gestão da Educação Infantil


As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Infantil(2) representam um marco na conquista de uma nova etapa na história da educação da primeira infância no Brasil, superando a dicotomia assistência e educação, fruto de uma história assistencialista.
No decorrer das atividades propostas na educação infantil, coletivamente os profissionais atuantes em creches ou pré-escolas criam pressupostos, acordos e regras básicas que são assumidos e transmitidos por seus integrantes como modos corretos de observar, pensar e sentir em relação ao trabalho desenvolvido e aos problemas criados. A proposta nesta modalidade precisa ser entendida num todo coletivo e não como um plano individual predeterminado. Planejar o currículo implica ouvir os profissionais em suas concepções e decisões, problematizar a visão deles sobre a creche e a pré-escola, evitando perspectivas fragmentadas e contraditórias, que refletem a influência das várias concepções educacionais que vivenciaram ou com que tiveram contato. Implica, reconhecer as famílias como interlocutoras e parceiras privilegiadas e garantir a participação delas e da comunidade no processo, tarefas que exigem a superação de muitos obstáculos.
Em vez de um método único de ensino, baseado em um processo cognitivo que se julga perfeito, homogêneo e irreversível, os subsídios propõem o encorajamento da familiaridade das crianças com novas situações participando de todos os espaços de aprendizagem que lhe são propostas nos diferentes momentos de permanência na instituição.
No artigo IV da Resolução nº 1, de 7 de abril de 1999, diz que:
“As propostas das instituições de educação infantil, ao reconhecer as crianças como seres íntegros, que aprendem a ser e conviver consigo próprio, com os demais e o próprio ambiente de maneira articulada e gradual, devem buscar a partir de atividades intencionais, em momentos de ações, ora estruturadas, ora espontâneas e livres, a interação entre as diversas áreas de conhecimento e aspectos da vida cidadã, contribuindo assim com o provimento de conteúdos básicos para a constituição de conhecimentos e valores.”

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1-  Os sistemas de ensino definirão normas de gestão democrática dos estabelecimentos públicos de educação infantil, atendendo aos princípios de participação dos profissionais da educação, da família e da comunidade, na elaboração e execução do projeto pedagógico da instituição e de participação das comunidades escolar e local em conselhos escolares ou equivalentes. (MEC)
2 - DCNEI – Resolução CEB Nº 1, de 7 de abril de 1999.

6a. Lição: Do assistencialismo ao pedagógico

Sabe-se que a discussão entre assistência e educação vem ocorrendo em momento de precisão conceitual, ou de transformação de “termos” em conceitos. A Constituição de 1988 e a LDB consagraram os termos creche e pré-escola, não os eliminando ou os substituindo por outros, como ocorreu na história da educação infantil norte-americana ou sueca (Rosemberg, 1989). Porém, nenhum dos documentos conceitua o que sejam tais termos, isto é, em que se aproximam e em que se diferenciam.
O embate atual entre educação e assistência no campo da educação infantil não está imune a disputas, mais ou menos conscientes, em torno de posições de poder, antigas e novas.
Considero que o que nos mobilizou e nos mobiliza (por exemplo, nos debates recentes sobre a LDB e o Plano Nacional de Educação), quando enfatizamos o direito à educação, de crianças pequenas, resume-se em duas idéias fortes: a busca na educação infantil (e não apenas por meio da ou pela educação) de igualdade de oportunidades para as crianças; isto é, espera-se, deseja-se, luta-se para que a educação infantil não produza ou reforce desigualdades (econômicas, raciais, de gênero); a adoção de uma concepção ampla de educação, aberta, indo além dos modelos que aqui conhecemos, de educação escolar; isto é, uma concepção de educação em acordo com a nova maneira de olhar a criança pequena que se está construindo no Brasil, como ser ativo, competente, agente, produtor de cultura, pleno de possibilidades atuais, e não apenas futuras.
Para Oliveira (1995): “Cada creche ou pré-escola pode organizar seu currículo ao redor de projetos didáticos que tenham a preocupação de trabalhar as emoções, a linguagem, à imaginação, além de noções pertencentes à esfera do conhecimento lógico (este, sim, mais verbal, mas explorado em situações concretas). Esses projetos devem ser desenvolvidos durante um tempo variável do ano escolar, por meio de múltiplas atividades”.
O projeto didático pode possibilitar às crianças diferenciar suas próprias experiências das de outras pessoas, pensar o presente e o passado, o sentido do tempo e do espaço. Por meio do projeto, podem ver o espaço como uma construção histórica organizada socialmente para atender necessidades criadas nas comunidades e trabalhar o tempo como um ato de liberação do presente, considerando as diferentes temporalidades existentes no cotidiano. Suas representações sobre o tema são reelaboradas pelo olhar da professora, que, durante todo o processo, tenta apreender as hipóteses e as significações infantis.

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Dadas as particularidades do desenvolvimento da criança de zero a seis anos, a Educação Infantil cumpre duas funções indispensáveis e indissociáveis: cuidar e educar, complementando a ação da família e da comunidade. (MEC,1998)